É possível descarbonizar os autocarros urbanos em Portugal?
Sim, e mais rápido do que se possa pensar. Tem custos elevados, cerca de 2,6 mil milhões em 14 anos, segundo o estudo "CleanBusPT", mas não o fazer terá custos muito maiores.
Nunca é demais repetir que o setor dos transportes é responsável por cerca de um terço (25%) da emissão de gases com efeito de estufa no planeta. Entre os poluidores maiores estão os transportes públicos e, em concreto, os autocarros urbanos, um dos grandes entraves à qualidade do nosso ar e um desafio para que os membros da União Europeia (UE) possam atingir a neutralidade carbónica a que se comprometeram até 2050. Será o nosso país capaz de alcançar estas metas? O estudo “CleanBusPT”, promovido pela Fundação Mestre Casais, especializada nas áreas da sustentabilidade humana e ambiental, não só diz que a descarbonizarão dos transportes públicos urbanos — neste caso, dos autocarros — é possível, como garantem que as emissões poderão vir a ser nulas a partir de 2035.
Segundo as conclusões do mesmo — que teve como ponto de partida a pergunta “É possível descarbonizar o transporte público rodoviário urbano das cidades portuguesas num prazo e custo suportáveis?” — substituir os autocarros urbanos existentes no país por modelos elétricos a bateria e a hidrogénio poderá demorar 14 anos e ter custo de 2,6 mil milhões de euros. Um valor total que não é “real”, até porque metade desse montante corresponde ao gasto normal de renovação da frota, o que significa que o custo efetivo da descarbonização seria de 1,3 mil milhões. Refira-se que a frota atual tem 5.633 autocarros e uma idade média de 15,9 anos, sendo que 24% dos autocarros que circulam têm mais de 21 anos.
O objetivo maior passa por substituir todos os veículos a diesel e a gás por autocarros elétricos. No caso dos veículos articulados, os que têm capacidade para transportar mais de 105 passageiros, está prevista a substituição por veículos a hidrogénio. José Gomes Mendes, ex-secretário de Estado Adjunto e da Mobilidade e um dos autores do estudo, defendeu aquando da apresentação das conclusões, que o Estado possa contribuir com 770 milhões, correspondente a 65% desta parcela. “Condições perfeitamente suportáveis para o Estado português e para os operadores”, avançou.
O estudo sugere um programa de abate e renovação que segue uma lógica de antiguidade, fazendo com que a idade média dos veículos em circulação desça um mínimo de 4,3 anos em 2026, situando-se nos 9,9 anos em 2034. Os 5633 autocarros seriam substituídos por 4675 veículos elétricos a bateria (83% do total) e 958 elétricos a hidrogénio. Cerca de 68% das substituições ocorreriam nos primeiros cinco anos o que teria efeito imediato ao nível das emissões. Estimam que, após os cinco primeiros anos de investimento, as emissões anuais de CO2 seriam reduzidas em 87%, as de óxido de azoto em 97% e as de partículas em suspensão em 99%. Num período de 14 anos, as emissões de gases de efeito de estufa seriam nulas.
Resultados que, segundo os responsáveis, só serão alcançados se atuarmos já e caso sejam seguidas uma série de medidas, fazendo por isso questão de deixar ao Governo e aos decisores públicos onze recomendações para atingir estas metas. Entre elas, está a proibição de venda de autocarros novos com motores de combustão interna a partir de 2023. Assumem que é a mais radical das recomendações, mas necessária. “O esforço de descarbonização não é uma ideia do Governo, é uma necessidade do país e de todos nós. Não faz sentido definirmos uma trajetória de eliminação de veículos de combustão interna e permitirmos, ao mesmo tempo, a entrada de novos, até porque, depois, teríamos de os deixar ir até ao fim da vida. Além do mais, já temos uma indústria de produção de autocarros elétricos madura em Portugal”, conclui José Gomes Mendes.